terça-feira, 26 de maio de 2009

Angoisse en bus



Numa dessas prosas fragmentadas num ônibus, com trânsito em horário de pico, nesse tempo de loucos, encontrei um amigo. Eu, com meu fone defeituoso que me transformava numa mono-ouvinte distraída, nem via a cidade me acenar pelas janelas. (Há pessoas que realmente valem a pena ser encontradas).

Meu amigo me disse entre sua barba rala: “A angústia é boa porque mobiliza o sujeito”. Mas eu de cá pergunto: E se ela estatelar o sujeito? Não confie tanto nessa angústia, ela chega sorrateira, se instala no peito e já era. Morre-se de amor, de tristeza e de angústia. Aliás, sabia que tristeza e angústia são diferentes? Diria que (sem querer de forma alguma incitar todos os meandros que tal comparação traz): a tristeza está para o erotismo assim como a angústia está para a pornografia. Sabia? Porque eu não sabia...só vim descobrir por agora.

E não tem festa do Bembé, samba, nem forró, esmalte carmim, nem beijinhos, nem Jazz que dê conta! Até fetuccini ao molho de camarão tentei. Não funcionou. Porque Belchior acha que esse desespero só craquelava em 1973?

Me rasgo toda por dentro tentando me libertar dessa vertigem de inércia. Os dias andam se debatendo sem sentido e um calendário permanente me tortura enquanto durmo. Respondo ao amigo: Tudo bem que ela me mobilize, contanto me agarre pelos cabelos e me beije depois!

sexta-feira, 22 de maio de 2009

A devoradora de traças



Alice tinha por edificação a dúvida.
Colecionava enigmas vulgares
(Qual o sabor das borboletas amarelas?)
Estendida sobre panos
cultivava pedras na praia e regava os pés.
Despia a solidão e beijava-lhe a boca
fazendo eco sobre as ondas.
Preferia amar o vento que lhe assanhava toda,
mexia-lhe as saias
e assobiava promiscuidades risonhas ao pé do ouvido.

As pontas dos dedos acariciavam canções
que ainda nem existiam.
Por vezes se imaginava nua entre as pessoas desapercebidas
e então dançava sozinha na calçada.
As vezes queria domar o mundo
que nem se pega bicho brabo nas unhas,
noutras ser levada como areia fina pela brisa.
Pensamentos enluarados enfeitavam seus sonhos.

Mas Alice era o cão!
Enfiava palitos nas bundas das formigas.